2 de abril de 2008

a leste do paraíso

Sem que se queira, a questão apresenta-se: Esgotou-se a capacidade?
Logo chegam as desculpas: Que tudo quer é prática. Que talvez só falte assunto. Que com o tempo isto vai.
A verdade é que a pena já não corre com a facilidade de outros tempos, em que os textos escorriam sem hesitações e faltavam dedos para tantas palavras.
A verdade é que o tempo é mesmo o grande escultor, como nos dizia a Marguerite e não somos nós que o esculpimos, como me quis fazer crer uma das minhas personagens. O tempo faz de nós o que quer e o que deixamos. O tempo envelhece-nos. Também nos ensina alguma paciência, que nem tudo são cardos.
Depois há também a outra questão: o umbigo. Uma pessoa, à força de tanto fugir de si mesma, enrola-se toda na cauda comprida, como no velho jogo da serpente, e quando dá por ela, está a morder a sua carne, enquanto definha com fome.
Sem que mal se dê por isso, passam os dias e as vidas e as pessoas vão-se arrastando, às vezes correndo, muitas vezes tropeçando, parando em momentos pontuais de qualquer coisa que se crê ser felicidade, como cão farejando terreno árido, para logo seguir ao mesmo ritmo sonolento, sem já nem se desiludirem porque deixaram de se levar por ilusões.
Por vezes, porque a sede é muita, as pessoas bebem água de uma poça estagnada, sem pararem para pensar noutra coisa que não no imediato. Esse imediato apenas lhes mostra água e no seu desespero essa água parece límpida e fresca. Bebem-na. Depois ainda seguem, momentaneamente saciadas, até que as entranhas começam o seu motim e quando se dá por isso, é já tarde demais.
Nem na praia se morre.

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