Esta mão sai hoje de cena. A outra ficará, se quiser. Esta sai.
15 de julho de 2008
14 de julho de 2008
sadness, picasso
10 de julho de 2008
nem consta que soubesse de contabilidade
8 de julho de 2008
saint-exupéry

- Adeus, disse a raposa. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.
- O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez a tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Os homens esqueceram essa verdade, disse a raposa. Mas tu não a deves esquecer. Tu tornas-te eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela tua rosa...
- Eu sou responsável pela minha rosa... repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
7 de julho de 2008
a alma dos outros
conforme
4 de julho de 2008
"câiguin"
3 de julho de 2008
armazém
Depois, nas mais distantes, nas gavetas do doutro lado da cama, nas gavetas mais baixas da cómoda, nas que ficam debaixo da cama, nas últimas portas do roupeiro, aquilo que raramente procuro.
2 de julho de 2008
insustentável

1
Quando eu era pequena, teria 5 ou 6 anos, um homem já velho perguntou-me como me chamava. Envergonhada, de mão dada com a minha mãe, disse-lhe o meu nome baixinho. Não o percebeu bem. "Teresa?", perguntou. Não, não era Teresa.
2
Na adolescência conturbada que foi a minha, como a de tantos, li "A Insustentável Leveza do Ser". Também tentei ver o filme, mas saí da sala a meio por me ver tão perturbada pelas vidas de Tomas, de Sabina. De Teresa.
3
Quando, já mulher feita, me iniciei nos tentâmes da prosa, as minhas heroínas começavam invariavelmente por ter o nome de Teresa. Depois, quando os alterava para não me repetir, era como se me estivesse a enganar a mim mesma. Relia os textos, mas era sempre Teresa o nome que lia.
Um dia pensei ter percebido tudo. Nesse dia decidi reler "A Insustentável Leveza do Ser", a esta nova luz que é a da idade que tenho, e nesse dia pensei ter percebido tudo. Eu sou a Teresa. Não a do Kundera, mas a que gerou a do Kundera. A mesma que gerou as minhas heroínas. Um pedaço aqui, outro ali, junto-os e sou eu. A Teresa.
5
Os acasos. Para Tomas e Teresa foram quantos? Seis? Para que se cruzassem. Para que sim. Os acasos. “Pássaros poisados nos ombros.” Há quem diga que às vezes pesam. Para saber disso é preciso não se andar distraído. E depois, claro, não se andando distraído a gente dá pelos outros. E pelos sentimentos dos outros. A compaixão. Que nas línguas derivadas do latim significa que ninguém pode ficar indiferente ao sentimento de outrem.
6
É como se estivesse presa a Teresa. Como se me fosse mais fácil pegar em fotocópias e contar a vida a preto e branco, com sombreados.
7
Um dia pensei ter percebido tudo. Todas as mulheres poderiam ser a Teresa. Umas mais fortes, outras mais fracas. Umas mais submissas, outras mais inconformadas. Umas comandadas pelo intelecto, outras pela emoção. Outras vivendo dicotomias de dia sim dia não. Algumas nunca se apercebendo de que são a Teresa.
8
“O que é positivo: o peso ou a leveza?”Há quem tenha vivido a leveza de não ter ciúme, medo, insegurança e tenha sentido essa leveza como um peso incomportável. Há quem viva com os ombros carregados desses outros pássaros que são os que minam a auto-estima e não atravesse as portas que se lhe abrem para a fuga.
9
Há pássaros, desses geneticamente habituados a viver em gaiolas, que não fogem quando lhes surge a oportunidade. Também há pessoas assim.
10
Não me lembro da cara de Teresa. A do filme. Lembro-me do chapéu de côco de Sabina. Lembro-me de Tomas a olhar para o relógio enquanto se apressava em cima desta amante. Lembro-me de uma mulher, que era Teresa, andando pelas ruas enquanto fotografava os tanques soviéticos da invasão. Mas não me lembro da sua cara. Na minha memória surge uma mulher magra, de cabelos curtos e escuros e a sua cara é a minha.
11
Releio esta insustentável leveza e o grafismo ilude-me, ou eu a ele. O nome Sabina surge-me sempre como Sabrina. Como da primeira vez. Assim como leio Teresa no lugar dos outros nomes que foram a segunda escolha para as minhas heroínas.
Há coisas a que parece ser muito difícil fugir.
12
São muitas as relações em que estamos por metade enquanto o nosso pensamento está alheio, quase como Tomas em cima de Sabina, apressado.
Assim como quando vamos ao teatro. O que vemos são os actores, o palco, o que nos mostram. Por trás deles vive-se toda uma intensa corrida, uma espécie de murmúrio imperceptível, como nos quadros de Sabina.
Esse murmúrio é quem somos, a Teresa, a original. E os actores e o palco o esquisso do que gostaríamos de ser.
13
A primeira vez que se soube objecto de uma traição, desse saber que é conhecer factos mais do que senti-los, a mulher chamava-se Teresa.
Só se lembrou disso mais tarde.
Mais tarde, também, leu que a traição não é mais do que querer sair da fila e partir para o desconhecido.
Não acreditou.
14
Porque teria o velho ouvido Teresa quando lhe disse o meu nome?
Tenho-o repetido baixinho, o nome sussurado com voz de menina. Não é parecido.
Um acaso. Desses a que só damos importância quando nos faltam as coisas que dizem ser verdadeiramente importantes.
15
Quando me passeei pelas ruas de Praga era ainda nova demais para saber que Teresa estava em mim.
Era como se estivesse adormecida dentro do livro que se lera impunemente, na praia, irresponsavelmente.
Se há crime e castigo, esse foi o meu crime e sou agora castigada.
16
Agora sei porque não gosto das outras mulheres. Tenho medo delas. Todas elas são minhas rivais, mesmo que nenhuma de nós saiba com que rivaliza.
Um nome de mulher, apanhado assim do nada, cerra-me os lábios gelados de ciúme. Ou de inveja. Finalmente, de medo.
Também Teresa só crescia detrás da sua lente mágica ou de livro de lombada grossa nas mãos.
Também Teresa tinha medo.
Em tudo me imita. Mas dela não tenho medo. Somos demasiadamente íntimas para que pudesse temê-la.
17
Teresa ensinou-me umas coisas sobre o ressentimento. Aprendeu-as com Shakespeare, e passou-mas.
Eu, que mais nova pedia sonhos para viver ou veneno para morrer, agora tomo veneno não sabendo que afinal morro.
18
Neste ponto, suponho que se ouvir o nome Teresa na rua, me viro para responder à chamada.
Seja como fôr o nome que temos é apenas emprestado, nada diz de nós, apenas diz do gosto ou opções de quem o escolheu para nós.
Posso ser Teresa de nome, já que o sou de caminho. Tal como sou outro nome qualquer, tanto faz, o que somos não é o nome que temos.
Houve estes acasos, é certo; talvez alguém tivesse trocado as voltas ao meu destino (se o houvesse!) e não me escolhesse o nome de Teresa a ver se lhe fugia, mas não podemos fugir de quem somos. Somos a nossa casa e é sempre para lá que voltamos.
19
Por vezes apenas a laranja. Mecânica.
O chapéu.
"Ofereces-me um chapéu de côco no meu aniversário?"
20
Pobre Teresa. Que caminho ainda por percorrer. Também eu, quando pela primeira vez traí, vomitei. Depois, ao chegar a casa, toda a água foi pouca para lavar o corpo, a boca. A consciência, essa, não se lava com água. Mas isso foi da primeira vez. Depois já não custa tanto. E com o tempo aprendemos a silenciar a voz inoportuna da consciência com frases feitas como a de Sabina, “Traír é sair da fila e procurar o desconhecido”.
21
Também eu me olho ao espelho.
Nua, tento ver-me de todos os ângulos. Sou no corpo como sou na alma: um todo dividido, um uno falsificado.
O corpo: metade sensual, metade anacrónico; metade apelando ao olhar masculino, metade angustiantemente dispensável.
A alma: metade pragmática, metade sonhadora; metade exigindo cada coisa no seu lugar, metade perdendo-se em emoções desarrumadas.
22
Como é isso de aprender a leveza? Aprende-se? Em livros que nos dizem que a resposta está... em nós mesmos.
Muito obrigada.
23
Teresa não podia conseguir renunciar à força. Logo, não poderia amar.
Ou então amar também não tem a ver com isso.
Mas então tem a ver com quê?
24
Não temos senão como voltar ao lugar onde fomos felizes. O que nos acontece, por vezes, é perdermos-nos no caminho de volta. A imagem que guardamos do lugar onde fomos felizes é adulterada por inúmeros factores e, por vezes, pensamos ter voltado e não voltámos. Depois dizemos que não se deve voltar aos lugares onde fomos felizes. Então voltamos onde, quando não podemos seguir em frente nem ficar parados?
25
Se teimo em ler 'Sabrina' onde está escrito 'Sabina', se teimo em ler 'Teresa' onde estão os outros nomes das heroínas das minhas histórias, isso poderá querer dizer que vejo o que quero, como quero? Que pinto e moldo a realidade a meu jeito? Então porque faço as escolhas que faço? Porque não escolho uma realidade mais leve, sustentável e suportavelmente leve?
26
Perdi-me de Teresa quando me perdi de mim.
O chapéu permance no bengaleiro. Tem pó. Devia ser escovado. Como ela fazia, sentada naquela cadeira, a que fica mais perto da janela, de costas para a luz, sentada sobre as pernas cruzadas.
póstumo
Como se estivesse fadada, desde o dia 1 deste texto, ao mesmo fantasma. Um fantasma de carne e osso que teima em sorrir-me enquanto estica a perna que, já me disseram, se parece com a minha, a fazer-me tropeçar, esperando pelo momento em que caio, o momento da minha derrota que será a sua vitória por não poder ter outras.
longe da vista, perto do coração
Sempre me foi mais fácil falar com os homens. As conversas de mulheres são menos fáceis. Os homens julgam menos. Estes homens julgam menos. Ou não julgam, sequer. O Rogério não me julga. Não me cobra. Não espera. E essa liberdade não são todos que a têm.
1 de julho de 2008
em montparnasse
Nem sequer se pode dizer que eu tenha algum tipo de relação com cemitérios. Dos que me morreram, a única pessoa que visito na campa é a minha avó paterna. Não só porque sinto a sua falta, porque também sinto a falta dos outros. Não só porque ainda tenho coisas para lhe dizer, porque também fiquei com muito para dizer aos outros. Talvez porque me está tão longe, e quando faço 200 km para ir à aldeia, não posso deixar de percorrer meia dúzia de passos a pé para lhe fazer uma visita.
Vem isto a propósito da minha curta visita a Paris e da visita a 2 cemitérios.
De mapa na mão, não podia deixar de me aproximar fisicamente de Éluard, de Balzac, de Sartre, de Baudelaire, se de outras formas tanto me aproximei.
Mas foi junto à campa da Duras que tudo aconteceu. Foi junto a essa campa modesta, semi-abandonada, dissimulada entre outras, sob um velho vaso de barro com flores secas, que tive um vislumbre de quem sou. Sou, indubitavelmente, aquela que em jovem já era velha. Aquela que amou contra todas as conveniências. Aquela que escreveu -tão aquém do seu mister- para não morrer de solidão ou de desespero. Aquela que fumou cigarros seguidos desafiando a morte, escrevendo na escuridão, desafiando a cegueira.
Um vislumbre apenas, e foi tanto.
Neste momento, neste momento preciso, sei quem sou, sei que me basto, sei o que quero, sei de onde venho. Sei estas coisas todas, não sabendo nenhuma. Porque fisicamente perto da Duras, depois de tanto a ter acompanhado, tive um vislumbre de quem sou.
E cresci, de repente, como se me tivesse morrido a mãe ou o pai.
E neste momento, neste momento preciso, não tenho medo, não tenho medos. E sei que é possível que por vezes a vida não seja madrasta, e sei que é possível sobreviver-lhe quando me dá a provar o veneno da sua maçã.
"Rumo às caraíbas, o mar estava calmo. Mas disso ainda não consigo falar."
30 de junho de 2008
honte de quoi?
16 de junho de 2008
Paris, je t'aime :)
Esta semana não contem comigo, não estou cá. Ou melhor, estou fisicamente, mas a minha cabeça está nas nuvens. Nas nuvens que vou ver quando o avião as sobrevoar a caminho de... PARIS!!!!
Oui, bien-sûr, moi, je vais à Paris. Moi et mon pauvre français, nous allons à Paris!
A contagem agora é descrescente e aproveito as esperas ao telefone, aqui no escritório, para ir imprimindo dicas, à sucapa.
Entretanto, vou relembrando as aulas de francês, a ver se não me escapa o vocabulário essencial e os nomes de tudo o que tenho que visitar.
(Bonjour Nicole! Bonjour Robert! Bonjour Patapouf! Ah, como isto vai longe...)
Portanto, foi preciso chegar a esta provecta idade e ter uma filha que amará a Eurodisney para me decidir. Que pena não ter entretanto enriquecido para me poder embrenhar na cidade toda. Mas não faz mal, pelo menos vamos. A minha filha saltita de contentamento e eu só não o faço também porque era capaz de parecer mal. Mas estou em pulgas.
É a viagem, a cidade, a amiga que vou reencontrar, o mais-que-tudo que me vai beijar em Paris junto ao Sena (espero...), sou eu a perder um ano de idade com cada euro gasto nesta bendita viagem.
Ah, nunca mais é Samedi...
12 de junho de 2008
tango
com facas não se brinca
Como esquecemos palavras duras que teimam em ecoar-nos no cérebro? Como faremos para nos lembrarmos da formulação exacta daquelas que podem ter mudado a nossa vida?
11 de junho de 2008
6 de junho de 2008
Distimia
Agora ele diz-me isto, que não há fuga possível, que só há refúgios.
5 de junho de 2008
palavras para ti, chefe
"Quem meus filhos beija, minha boca adoça"
Podes até não beijá-la, nem adoçar a minha boca, mas pelo menos, não a faças chorar com o teu egocêntrismo.
4 de junho de 2008
desamizade 2
espelho meu
desamizade
3 de junho de 2008
um recado para o céu

lista de compras
avestruz
2 de junho de 2008
Bon Jovi Live @ Rock in Rio Lisboa- You Give Love A Bad Name
Tá bem, não sou fã nem nunca fui. Mas a gente conhece as canções, quer queiramos, quer não, também crescemos com elas, e voltar a ouvi-las é rejuvenescermos umas duas dezenas de anos, e ele até é um frontman digno do título e assim, e às vezes é bom esvaziarmo-nos e deixarmos entrar alguma futilidadezinha, de tal modo que, de entre os vários concertos dos dois dias em que fomos, exceptuando o do João Gil no Sunset, este foi mesmo o mais envolvente.
E este ano portei-me tão bem :)
30 de maio de 2008
parabéns Fernanda
eu não vou ao Rock in Rio
28 de maio de 2008
não escutem as conversas alheias
27 de maio de 2008
da violência infantil
26 de maio de 2008
comentários
dos passos
da felicidade dos outros

21 de maio de 2008
18 de maio de 2008
conjunto de letras
16 de maio de 2008
pistas
laura, a que tem um diário da sua morte
15 de maio de 2008
bingo! ("what movie is your love life)
Your Love Life is Like Annie Hall |
![]() You believe that love (if you even believe in love!) is a very complicated thing. Maybe love is pain. Or maybe it's all a big therapy session. You're still figuring it out. Your love style: Brainy and a bit neurotic Your Hollywood Ending Will Be: Realistic and reflective |
schiu

Os nossos segredos são fáceis de guardar, porque são nossos e deles nos podemos envergonhar ou temer que nos julguem se eles vierem a ser do conhecimento de outros. Agora os segredos dos outros... nem todos os sabem guardar.
marcar a ferro
14 de maio de 2008
desculpa Mari

teias de aranha
Um destes dias, quase a pedido, deu-me para desenterrar ficheiros no computador. Cartas de amor, desenhos de amor, promessas, despedidas. Poemas de adolescência. Outros poemas. Páginas que não chegaram a levar a nada. Textos de outros.
No computador, como nas gavetas, como na memória acumulamos pó.
13 de maio de 2008
ao engano
Durante um tempo, achava que a culpa devia ser minha. Que dava sinais errados. Que sorria demais. Que inclinava demais o tronco. Que falava demais, também. Os dissabores sucediam-se. Comecei a não perdoar aos amigos que me liam mal, não tolero amizade com flirt, se não for consensual.
Voltei para casa algumas vezes absolutamente confusa: em que momento dei a entender que determinado gesto poderia ser aceite? Quando foi que dei a entender que aquela mão ou aquela boca se podiam estender para mim, daquele modo?
Até que percebi. Não sou eu.
12 de maio de 2008
9 de maio de 2008
sei de um rio
balança
8 de maio de 2008
Graça
a mentira
7 de maio de 2008
[sem assunto]
Na verdade, habituamo-nos a ficar limitados sempre ao mesmo e não inovamos, não surpreendemos. Casamos com as palavras como casamos uns com os outros, prontos a ceder à rotina, ao hábito, ao institucional.
Hoje aprendi uma palavra em alemão e passei o dia a tentar encaixá-la em tudo o que dizia. Dêem-me um desconto, hoje foi um dia difícil no trabalho, tinha de arranjar um escape. Assim, para não me passar de vez, hoje andei mais desenfiada do que é hábito e a Florbela até chorou a rir com o que lhe disse, e isso soube-me bem.
E os mais próximos, desesperados como eu, optaram pela mesma via, e no meio do descalabro que hoje nos surpreendeu, soubémos rir dos caminhos errados, como se assim afugentássemos o medo de não dar a volta a mais esta situação.
Sim, eu sei, este texto devia ser imediatamente apagado, tal a sua falta de estrutura, mas este é mais um escape.
Mais uma hora e saio daqui.
marco do correio - carta terceira
(carta a uma morta em vida)
Quando eras pequena a tua irmã chamava-te morcego.
2 de maio de 2008
15 anos
30 de abril de 2008
o grande sedutor
o trigo e o joio
cartas portuguesas
Soror Mariana Alcoforado
Eu tinha menos de 20 anos, isso é certo, talvez 17, já não importa. De livro na mão deitei-me, noite cerrada. A luz era fraca, mas eu lia sempre assim, já não me fazia diferença.
Acho que são 5 as cartas. Num crescendo de dor e desespero. De quem sentiu para poder escrever e, mais tarde, de quem leu, de mim também.
Na última carta já a dificuldade era imensa para conseguir perceber as letras. As lágrimas pareciam rios. Rios no inverno, não como o Guadiana, vizinho de Soror Mariana, no verão.
Chorei por ela, com ela, por mim. Convulsivamente. Empenhada em abafar os sons desse choro descontrolado para não acordar os meus pais, no quarto ao lado.
Foi esse o meu choro mais profundo, o mais sofrido, o mais liberto e o mais libertador. Não voltei a chorar assim.
(Neste, meu amigo, não senti a dormência nos dedos, a do orgasmo, lembras-te?)
Não voltei a relê-las. Não de um fôlego, quem seria capaz?
Hoje, quando a caminho da aldeia faço um desvio e passo junto à casa Alcoforado, mais do que quando passo no museu e olho a janela por onde Mariana via passar o seu cavaleiro de Chamilly, fico constrangida. Sonho com um bafejo de sorte que me permitisse comprar aquela casa, mesmo sabendo que não sou merecedora dela. Não mais do que o cavaleiro foi merecedor do amor de Mariana.
Será natural às mulheres alentejanas amarem assim? Não foi a Florbela Espanca (Mas que me importa a mim que me não queiras, Se esta pena, esta dor, estas canseiras, Este mísero pungir, árduo e profundo, Do teu frio desamor, dos teus desdéns, É, na vida, o mais alto dos meus bens?É tudo quanto eu tenho neste mundo?) a sua mais soturna prova? Não somos ainda muitas de nós seu testemunho?
nuances
29 de abril de 2008
idiossincrasias
- Estás chateada?
- Não...
- Mas estás com cara disso.
- Mas não estou.
- Então, o que se passa?
- Nada...
- Disse alguma coisa que não devia?
- Não...
- Fiz alguma coisa que não devia?
- Não...
- Devia ter dito ou feito alguma coisa que não fiz ou não disse?
gramatical-mente
o gato da alice
(não sei onde raio ouvi isto, mas tem o seu quê, tanto quanto as toneladas de frases feitas que por aí circulam)
"O importante na imagem é como ficas; não quem está ao teu lado nem o pano de fundo. O que importa é se estás a sorrir."
28 de abril de 2008
terapias
Se calhar, querer a alma dos outros, passa por isto.
27 de abril de 2008
o homem que estendia roupa olhando o rio
Eu não morava ali, mas era como se morasse, que às vezes a gente sente que a nossa casa é olhar uma pessoa.
Nas tardes quentes gostava de o ver, alheio às pessoas, por momentos apenas o rio, a ponte, os telhados das outras casas.
De longe via-lhe os olhos escuros e densos. As mãos que prendiam a roupa com molas de plástico. Seriam mãos de afago? Seriam olhos capazes de dizer amor ou paixão?
A corda da roupa não gemia e eu ouvia apenas os pássaros nas nespereiras, em baixo, e uma espécie de queixume que me chegava da ponte. Ou então, não ouvia nada e apenas imaginava. Como imaginava o homem a enlaçar uma mulher de quem gostasse, a encostá-la à varanda quente, a sussurar-lhe que gostava de a ter ali.
Às vezes há momentos quase perfeitos.
A última elegia (V)
O L
O F E S
R S H E
O OFC A
no anticlímax da aurora!
Na hora da nossa morte et nunc et semper
uer ar iú
Ó fenesuites, calmo atlas do fog
"... it is, my soul, it is
Her gracious self..."
murmura adormecida
É meu nome!...
sou eu, sou eu, Nabucodonosor!
Motionless I climb
the wa
t
e
r
Am I
a Spider?
Am I
a Mirror?
an X Ray?
No, I'm the Three Musketeers
rolled in a Romeo.
Da alta e irreal paixão subindo as veias
Alas, celua
Me iluminou, celua me iludiu cantando
meus passos
Comendo o tempo em tuas cornijas
- from the dark bull-like tower
Que à noite bimbalha bimbalalões de badaladas
Dost thou remember, dark love
quando early morn'
Eu vinha impressentido, like the shadow of a cloud
ô brisa do Tâmisa, ô ponte de Waterloo, ô
Roofs of Chelsea, ô proctors, ô preposterous
- terror no espaço!
- silêncio nos graveyards!
- fome dos braços teus!
Só Deus me escuta andar...
- ando sobre o coração de Deus
Em meio à flora gótica... step, step along
*
O roofs of Chelsea!
... escrevi um soneto...
... escrevi uma elegia..."
Ô darlíng, acorda, give me thy eyes of brown, vamos fugir
"... escrevi um soneto...
... escrevi uma carta..."
Ô darling, vamos fugir para a Inglaterra?
..."que irão pensar
Os quatro cavaleiros do Apocalipse..."
"... escrevi uma ode..."
Ô darling!
Ô PAVEMENTS!
Ô roofs of Chelsea!
Encantados roofs, noble pavements, cheerful pubs, delicatessen
... don't cry
... don't cry
RESOUND
Ye pavements!
- até que a morte nos separe
ó brisas do Tâmisa, farfalhai!
Ó telhados de Chelsea,
amanhecei!
Londres, 1939
Vinícius de Moraes
24 de abril de 2008
fracturante
Liberté, Paul Eluard
Sur mes cahiers d'écolier
Sur mon pupitre et les arbres
Sur le sable sur la neige
J'écris ton nom
Sur toutes les pages lues
Sur toutes les pages blanches
Pierre sang papier ou cendre
J'écris ton nom
Sur les images dorées
Sur les armes des guerriers
Sur la couronne des rois
J'écris ton nom
Sur la jungle et le désert
Sur les nids sur les genêts
Sur l'écho de mon enfance
J'écris ton nom
Sur les merveilles des nuits
Sur le pain blanc des journées
Sur les saisons fiancées
J'écris ton nom
Sur tous mes chiffons d'azur
Sur l'étang soleil moisi
Sur le lac lune vivante
J'écris ton nom
Sur les champs sur l'horizon
Sur les ailes des oiseaux
Et sur le moulin des ombres
J'écris ton nom
Sur chaque bouffée d'aurore
Sur la mer sur les bateaux
Sur la montagne démente
J'écris ton nom
Sur la mousse des nuages
Sur les sueurs de l'orage
Sur la pluie épaisse et fade
J'écris ton nom
Sur la vitre des surprises
Sur les lèvres attentives
Bien au-dessus du silence
J'écris ton nom
Sur mes refuges détruits
Sur mes phares écroulés
Sur les murs de mon ennui
J'écris ton nom
Sur l'absence sans désirs
Sur la solitude nue
Sur les marches de la mort
J'écris ton nom
Sur la santé revenue
Sur le risque disparu
Sur l'espoir sans souvenir
J'écris ton nom
Et par le pouvoir d'un mot
Je recommence ma vie
Je suis né pour te connaître
Pour te nommer
Liberté