16 de maio de 2008

laura, a que tem um diário da sua morte

A Laura é um todo. E nesse todo, caibo eu.
A Laura não existe. É personagem. Daquelas que eu crio para poder matar, vá-se lá saber porquê.
Porém, poucos dias depois de receber o texto, a um quarto da leitura, o meu amigo Rogério deu-lhe vida. Fê-lo colando-a à actriz que o atraíu, na peça de teatro que foi ver. Fê-lo colando-a à amiga especial que o acompanhava, os mesmo jeans, as mesmas curvas cobiçadas. Deu-lhe vida, a ela que morre no decorrer nas páginas, adivinhando-lhe a sensualidade e torcendo por ela quando percebe do seu interesse pelo baterista do prédio em frente.
Eu matei-a porque é assim que sei fazer. Mas alguém que não sabe que ela morreu para eu poder continuar viva, descobriu-lhe a feminilidade que ela renega. Alguém que não conhece os seus cabelos vermelhos ficou a desejar que ela viva para além da existência.
Ao fazê-lo (e ao tirar tempo do seu para a conhecer), o Rogério deu sentido ao que se ia assemelhando a uma marionette.
E eu, que quando dou esses pedaços de mim a alguém fico despida, desta vez recebi em troca uma manta, dessas muito velhas que não trocamos por outras, onde nos enrolamos no sofá, à noite, ou na praia, nas noites frias de verão.
Ao fazê-lo, o Rogério desmente a gaivota da história, com a sua irritante mania de que sabe tudo.
Eu, que deixei de contar nesta história, fico de lado, sorridente, comprazida, quase a achar que não são só as paredes que me ouvem.